Massacre em Suzano

ATIRADORES ERAM INCELS DE CHAN

Por
*Guilherme Peace

Não adianta dizer que os assassinos de hoje eram “loucos”. Jornalistas e Polícia precisam fazer um trabalho menos preguiçoso que isso. Em 15 minutos de conversa com estudantes na porta da escola Raul Brasil hoje cedo e mais uns segundos olhando para a foto de um dos atiradores e já percebi que se tratava de um “channer incel”, participante de fóruns, e que o crime foi motivado por isso.

Uma breve pesquisa na internet às 13h confirmou minhas suspeitas. Outros channers, alguns bem famosinhos, comemoravam abertamente o “grande dia”, como escreveram em postagens. A grande mídia foi falar disso – bem por cima – no final da tarde.

Os dois atiradores do massacre de hoje fazem parte de toda uma cultura submersa da internet, que esbarra na superfície em páginas de memes, mas que sobrevive mesmo nos imageboards conhecidos como “chans”. No mar de lama e esgoto destes fóruns, garotos e homens que se autointitulam machistas e direitistas assumidos fazem postagens bizarras sobre racismo, homofobia e principalmente sobre ódio contra as mulheres, a quem culpam por não lhes darem chance de perder a virgindade. Daí o título de “incels” – involuntary celibatarian (celibatários involuntários).

Tutoriais sobre como estuprar, matar, sequestrar, abusar estão disponíveis a poucos cliques, na cara de todo mundo, junto com pornografia infantil (que eles chamam de “CP”, de “childish porn”, para meninas de 0 a 9 anos, e de “AP”, para meninas de 11 a 17 anos), vídeos e fotos das maiores barbaridades contra minorias como negros e LGBTs e outras bizarrices. Na SURFACE. Se formos para a Deep Web, então, passaria horas escrevendo sobre o que é possível encontrar.

Os dois atiradores que fizeram o massacre hoje planejaram o crime com antecedência em um desses fóruns, foram ajudados com ideias e, ao que indicam os prints, com a compra do armamento. E agora são celebrados como heróis, chamados “homen sanctvs”, como acontece desde 2011 nesse mesmo esgoto em relação ao assassino do Massacre do Realengo, no Rio.

Em pouco tempo de navegação na internet da superfície consegui encontrar não apenas comemorações, mas ameaças de outros autointitulados incels, dizendo que vão fazer suas próprias versões dos massacres. E é isso que a Polícia e os jornalistas não podem ignorar.

É preciso investigar os fóruns e grupos dos chans, usar um aparato poderoso de Inteligência e prender os criminosos que se escondem nos navegadores anônimos desse culto.

E é preciso que os jornalistas sejam criativos na abordagem midiática desses casos para não dar aos channers o que eles querem: fama. Que se substitua a cobertura “urubu” da desgraça e da tragédia por uma investigação verdadeira do submundo que transborda até em canais populares de Youtube e páginas de memes e shitpostings. Mas, principalmente, para que as pessoas comuns do dia a dia saibam que isso existe e que podem ter um psicopata destes em casa, menino inteligente e de boas notas que passa o dia todo no computador conversando com os amiguinhos sobre como conquistar a “glória” ao matar o maior número possível de crianças e mulheres antes de cometer suicídio.

*Guilherme Peace é jornalista

Foto:
ANDRE PENNER AP

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