Lei Maria da Penha: DF recebeu 129 mil denúncias de violência doméstica nos últimos dez anos

Delegacia de Atendimento à Mulher no Distrito Federal — Foto: TV Globo/Reprodução

Registros aumentaram 62% na comparação entre 2009 e 2018. Casos de injúria, ameaça e lesão corporal são maioria.

Por Carolina Cruz, G1 DF

Delegacia de Atendimento à Mulher no Distrito Federal  — Foto: TV Globo/Reprodução

Delegacia de Atendimento à Mulher no Distrito Federal — Foto: TV Globo/Reprodução

Nos últimos dez anos, as delegacias do Distrito Federal receberam 129.575 denúncias de violência doméstica. O levantamento obtido pelo G1, por meio da Lei de Acesso à Informação, mostra que o número de registros cresceu 62% entre 2009 e 2018.

Ainda de acordo com a Polícia Civil, somente de janeiro a agosto deste ano foram 10.909 ocorrências do tipo– o que dá uma média de 45,4 denúncias de violência por dia.

Ao procurar as autoridades, as mulheres buscam se proteger e punir agressores por meio da Lei Maria da Penha, a primeira legislação brasileira criada especificamente para a violência doméstica (saiba mais abaixo).

Apesar do crescimento expressivo no número de ocorrências, o problema pode ser ainda mais grave, já que nem todos os casos são denunciados mas, ainda sim, deixam marcas dentro de casa e vítimas que seguem invisíveis para as estatísticas.

  • Para a advogada criminalística Soraia Mendes, especialista em Direito da Mulher, os dados não refletem a realidade de violência vivida pelas vítimas e “ainda há muito o que avançar”.

“Muitos casos sequer chegam até as autoridades. O âmbito criminal é importante, mas é mais importante que modifiquemos essa forma de tratamento às mulheres no nosso país, que tem uma marca de violência autoritária e patriarcal muito forte.”

Violência em números

Em 2009, mulheres procuraram a polícia do DF para denunciar um agressor 9.484 vezes. Já em 2018, o total de ocorrências saltou para 15.450 registros. Veja a trajetória dos dados:

Gráfico mostra trajetória da Lei Maria da Penha no DF entre janeiro de 2009 e agosto de 2019 — Foto: Aline Avelino e Amanda Martins/Arte G1

Gráfico mostra trajetória da Lei Maria da Penha no DF entre janeiro de 2009 e agosto de 2019 — Foto: Aline Avelino e Amanda Martins/Arte G1

Tipos de agressão

A Lei Maria da Penha prevê punição para casos de violência física – como estupro e lesão corporal – psicológica, como injúria e ameaça; além das violências patrimonial e moral. Em uma mesma ocorrência, pode haver mais de um tipo.

Das 10.909 denúncias registradas neste ano, a maioria das vítimas cita injúria (6.767 casos) e ameaça (6.674). Houve crescimento desses dois tipos de violência em relação ao ano passado. (Veja gráfico abaixo).

Gráfico mostra tipos de ocorrência de violência contra a mulher registradas no DF em 2028 e 2019 — Foto: Aline Avelino e Amanda Martins / Arte G1

Gráfico mostra tipos de ocorrência de violência contra a mulher registradas no DF em 2028 e 2019 — Foto: Aline Avelino e Amanda Martins / Arte G1

Apesar de abordar questões de violência, a Lei Maria da Penha não trata de feminicídio – pois a legislação que tipificou os casos de mulheres mortas pela condição de gênero foi sancionada quase 10 anos depois, em 2015.

Agressões em casa

Dados recentes mostram que mais da metade dos agressores são ex-companheiros ou mantinham algum tipo de relacionamento com a vítima e/ou moravam com a mulher antes ou no momento da agressão (55,8%).

Já a violência praticada pelos pais ou irmãos da vítima representam, quando somados, 12,6% dos casos. Veja abaixo:

Gráfico mostra a relação entre vítima de violência doméstica e agressor  — Foto: Aline Avelino e Amanda Martins / Arte G1

Gráfico mostra a relação entre vítima de violência doméstica e agressor — Foto: Aline Avelino e Amanda Martins / Arte G1

Casos recentes

Neste ano, o DF acumulou casos de mulheres que foram agredidas na frente de membros da família. Na madrugada desta sexta-feira (15), uma vítima chegou a ser trancada dentro de casa com os dois filhos enquanto apanhava do companheiro, que estava embriagado.

Em outro caso, a mãe de uma vítima de feminicídio, Judite Alves dos Santos, de 60 anos, viu a filha ser assassinada e ainda foi ameaçada pelo agressor que, segundo a polícia, mandou ela assumir a autoria do crime.

Alta em 2019

Ao analisar apenas o ano de 2019, o total de denúncias entre janeiro e agosto supera os registros no mesmo período do ano passado na maioria das regiões administrativas. Este cenário ocorre em 19 das 31 regiões administrativas analisadas em 2018 (veja números abaixo).

A região com maior número de denúncias é Ceilândia – que concentra a maior população do DF. Foram 1.617 ocorrências no ano passado contra 1.858 neste ano. Veja a relação de denúncias nas regiões administrativas:

Relação de denúncias de violência doméstica nas regiões administrativas do DF entre 2018 e 2019 — Foto: Aline Avelino e Amanda

Relação de denúncias de violência doméstica nas regiões administrativas do DF entre 2018 e 2019 — Foto: Aline Avelino e Amanda

Lei Maria da Penha

A Lei Maria da Penha foi aprovada no Brasil, em 2006, após o Legislativo brasileiro aderir à proposta elaborada por um conjunto de ONGs, em cumprimento a convenções internacionais da Organização dos Estados Americanos (OEA), ratificada pelo Brasil em 1994.

Ao longo dos anos, houve atualizações no texto para enfatizar a característica preventiva da lei. Veja algumas delas:

  • A violência doméstica independe de sua orientação sexual, ou seja, pode ser praticada por outra mulher
  • É proibida aplicar penas como multas ou cestas básicas. A sentença é de prisão ou o comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação.
  • O juiz pode decretar prisão preventiva quando houver riscos à integridade física ou psicológica da mulher.
  • A lei obriga a criação de juizados especiais de violência doméstica e familiar contra a mulher com competência cível e criminal.
  • A violência cometida contra mulher com deficiência tem pena aumentada em um terço.
  • O juiz pode conceder em 48 horas medidas protetivas de urgência como suspensão do porte de armas do agressor, afastamento do agressor do lar e distanciamento da vítima.

Para Soraia, advogada criminalista, a A Lei Maria da Penha vem sendo ainda compreendida como uma lei de natureza criminal e, [na verdade], “é um complexo de políticas públicas para que os Três Poderes [Legislativo, Executivo e Judiciário] responsabilizem agressores”.

A pesquisadora afirma ainda que a legislação deve ser vista como estratégia de prevenção “e não só para proteção nos casos de violência que já tenham acontecido”.

Como denunciar

Apenas após a vigência da lei, o Estado passou a criar canais de denúncia para a população feminina. O DF tem uma Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam), na Asa Sul, mas os casos podem ser denunciados em qualquer unidade.

O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), também recebe denúncias e acompanha os inquéritos policiais, auxiliando no pedido de medida protetiva na Justiça.

Em casos de flagrante, qualquer pessoa pode pedir o socorro da polícia, seja testemunha ou vítima. Veja telefones abaixo:

  • Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (DEAM)

Endereço: EQS 204/205, Asa Sul, Brasília-DF

Telefones: 3207-6195 / 3207-6212

  • Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT)

Endereço: Eixo Monumental, Praça do Buriti, Lote 2, Sala 144, Sede do MPDFT

Telefones: 3343-6086 e 3343-9625. Fax: 3343-9948

  • Prevenção Orientada à Violência Doméstica (Provid) da Polícia Militar

Contato: 3190-5291

  • Central de Atendimento à Mulher do Governo Federal

Contato: 180

Fonte: G1/DF

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